segunda-feira, 29 de setembro de 2008

IMPUREZA DE FORA – IMPUREZA DE DENTRO (Mt 15, 1 ss.)

O QUE PURIFICA OU CONTAMINA O HOMEM NÃO SÃO AS CIRCUNSTÂNCIAS, MAS A SUBSTÂNCIA

Certo dia, uns escribas e fariseus se escandalizaram com os discípulos de Jesus, e perguntaram ao Mestre por que eles não observavam as tradições paternas e comiam sem primeiro lavar as mãos. Não se referiam os acusadores a simples preceitos de higiene física, mas atribuíam a essa usança um caráter de impureza moral.
Pelo que Jesus lhes replicou com a seguinte comparação:
“O que de fora entra no homem não o torna impuro, porque vai para o estômago e daí é lançado fora; mas o que de dentro sai do homem, isto sim, o torna impuro; porque do coração é que vêm maus pensamentos, homicídios, adultérios, luxúria, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias – e são estas as coisas que tornam o homem impuro. Mas, isto de não lavar as mãos antes de comer não torna o homem impuro”.
O que vale da impureza de fora ou de dentro, vale também, mutatis mutandis, da pureza.
Há quase 20 séculos que persiste, no seio da cristandade, a idéia de que objetos e atos externos possam conferir ao homem pureza ou impureza – quando, na realidade, somente a atitude interna do sujeito é que dá ao homem pureza ou impureza moral e espiritual.
Certas teologias eclesiásticas atribuem poder de purificação e santificação a determinados objetos e palavras, ideologia essa herdada dos antigos “Mistérios” do paganismo romano. O pecador desejoso de purificação espiritual se dirigia aos centros de iniciação da Delfos, Elêusis, Ísis, Osíris, etc.; ia ter com os magos e sacerdotes órficos ou pitagóricos; tocava em determinados “objetos sacros”, ou ouvia palavras rituais, que, na opinião dos iniciadores, purificavam o iniciado e faziam dele um iniciado, purificado e redimido.
A palavra grega “mysterion” é, em latim, “sacramentum”. Os sacramentos eclesiásticos são a continuação dos mistérios pagãos; a sua função é de magia ritualista. Os iniciadores continuam a ser, como em tempos antigos, os sacerdotes.
Mais tarde, prevaleceu, numa grande parte da cristandade, a magia judaica, que atribuía redenção e santificação espiritual ao sangue de animais sacrificados. Salomão, refere o 1 livro dos Reis, por ocasião da dedicação do templo em Jerusalém, mandou matar 120.000 ovelhas e 22.000 bois. Cada ano no monte Sion, o sacerdote reunia, à entrada do templo, o povo de Israel, mandava vir um cabrito, colocava as mãos sobre a cabeça dele e transferia para esse animal inocente os pecados do povo; depois, esse “bode expiatório” era morto, e, segundo a crença dominante, com a morte do animal morriam todos os pecados do povo.
A teologia cristã substituiu o animal inocente pelo único homem sem pecados, Jesus, e atribuiu ao sangue dele um efeito redentor e espiritualizador – embora o próprio Jesus nunca tenha considerado seu sangue como elixir de redenção.
Num dos setores mais recentes do criatianismo, a purificação não é atribuída a objetos e palavras, nem ao sangue de um “bode expiatório”, animal ou hominal, mas sim ao próprio homem pecador que, através de sucessivas reencarnações físicas, se purifica progressivamente dos seus pecados.
Em todos esses casos, a pureza do homem vem de fora dele, por meio de objetos, fórmulas ou pelos pais dele – vem sempre de um fator alheio: objetos, sangue, pais.
Entretanto, segundo o Evangelho do Cristo, não há alo-redenção, mas tão somente auto-redenção. O homem não é salvo por algo ou por alguém – o homem se redime, se salva, se purifica, se santifica ele mesmo a si mesmo, não pelo seu ego humano, mas sim pelo seu Eu divino, que é o Pai nele, o seu Cristo interno, o Reino de Deus, a luz do mundo, que nele está e que deve despertar.
Esta auto-redenção é Cristo-redenção, Teo-redenção. Em termos modernos, esta auto-redenção se chama auto-realização.
Quando Jesus responde ao doutor da Lei que o primeiro e maior de todos os mandamentos consiste em que o homem ame o Senhor seu Deus com toda a sua alma, com toda a sua mente, com todo o seu coração e com todas as suas forças – que é isto senão auto-redenção, auto-realização? É a purificação que vem de dentro dele, e não de fora dele. Pois, assim como, segundo as palavras do Mestre, toda a impureza vem de dentro do homem, também toda a pureza vem do seu interior. Se do seu ego humano vem a impureza, do seu Eu divino vem a pureza.
Toda a purificação e santificação do homem vem do despertamento do seu Eu divino, que também se chama “renascimento pelo espírito”.
Parece que uma elite da humanidade cristã de hoje está começando a compreender esta verdade fundamental da mensagem do Cristo.